Lá não estava frio, muito menos calor. Mas ele começou a suar. E a tremer.
Do nada começou a pensar em sua vida. O que havia feito, o que havia sentido. "Será que fiz algo de bom? Mas o que é bom? Será o certo? Mas, o que é certo? E o errado? Sinceramente, não sei." Continuava a suar. Agora olhava para todos os cantos, nervoso. Até que a porta atrás dele se abriu e ela entrou. Aquela misteriosa mulher encapuzada que o trouxera até ali. Ela entrou, passou a mão no ombro dele e se dirigiu para o outro lado da sala. Baixou o capuz, tirou a capa, revelando um belo e decotado vestido preto. Sua tez pálida, porém macia, seus olhos escuros (pareciam roxos), seu nariz arrebitado, seu busto farto, tudo chamou, surpreendentemente, a atenção dele. Se não estivesse numa situação tão complexa teria olhado-a com olhos um pouco mais audaciosos.
Ela pendurou a capa nas costas das cadeiras. Soltou os longos e ondulados cabelos, brincando um pouco com eles, suspirou e puxou a cadeira. Sentou-se elegantemente. Suas mãos quase transparentes, dedos finos estampando os mais finos anéis e a coloração azulada das unhas, postas sobre a mesa, seus olhos, misteriosos, postos, vidrados no rosto dele. Sua expressão era indecifrável. Poderia estar sorrindo, ou poderia estar reprovando-o. E isso o deixava ainda mais nervoso.
No seu olhar parecia rondar um pouco de curiosidade. Ele, tremendo, começou a rever, mentalmente, toda sua vida. Será que tinha sido mau? Sim, admitia que sofrera sua explosões algumas vezes. Noutras, implodiu, abafando seus sentimentos mais revoltados. Mas sempre, sempre tentou fazer o que acreditava ser certo. E, provavelmente, conseguiu, mesmo que só um pouco. Talvez até tivesse tido seus orgulhos, suas intolerâncias,mas conseguiu o perdão, e perdoou também. Lembrou-se dos sorrisos(e risos, e gargalhadas) que provocou, dos abraços que distribuiu, dos beijos que lançou. Lembrou-se de como se sentia bem ao praticamente se anular ao ajudar quem quer que lhe pedisse ajuda. Lembrou-se de como se sentira culpado quando não conseguiu fazê-lo. Aliviou-se ao recordar que não provocara muitas lágrimas. Lembrou-se de amar todos que o rodeavam igualmente, sendo criticado por isso. Mas agora estava em dúvida. Naquele momento, naquela sala, naquela presença. Nada parecia mais fazer sentido. Ele parecia estar divisando um destino imutável e inexorável. Deixava transparecer seu desespero.
-Qual o meu destino?
A senhora sorriu.
-O que você acha?
-Não sei o que achar. Tenho medo do que pensar. No momento tenho a sensação de estar esperando por algo irrefutável, sem volta.
-Shh. Você não sabe o que está falando. Do lugar para onde você vai há volta. De todos os lugares nesse universo há volta. Todos têm direito a ir e vir. Todos têm direito a mudar. Todos têm uma segunda chance.
-Então eu terei uma segunda chance?
-Não sei. Não sou eu quem pode lhe dizer. Isso só depende de você. Depois que eu sair, você escolherá uma dessas portas aqui atrás.- Se levantando - Agora, se me der licença, tenho muitos outros e outras para atend...
-Espera!
-...
-Eu tenho uma última pergunta! O que é certo?
-...
-Qual é a verdade?
Ela esboçou um leve sorriso. Pegou sua capa, vestiu-a. Andou lentamente até atrás da cadeira dele. O coração dele mimetizava o ribombar dos trovões de uma furiosa tempestade. Ela colocou o capuz, abaixou-se para perto de sua cabeça e sussurrou em seu ouvido direito:
-Você ainda não sabe?
E saiu.
Rafael Victor
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